quinta-feira, 8 de agosto de 2013

NOMIOLO ENTREVISTA: Alexandre Lucas, Editor-Executivo de Arte da Revista Época


É com muito orgulho que hoje o NOMIOLO apresenta sua primeira entrevista. E para começar com o pé direito, nada melhor que o personagem ser Alexandre Lucas, 40 anos, Editor-Executivo de Arte da Revista Época e um dos grandes nomes do site Faz Caber. Preparem-se para uma aula nada básica de design editorial!


"Design é conteúdo e não dá para 
imaginar uma publicação de qualidade 
hoje em dia que não leve isso a sério".
 




Alexandre, qual sua formação?
Eu estudei design gráfico. Também frequentei cursos como comunicação social e ciências sociais, mas sem me formar. Também fiz diversos cursos técnicos como ilustração artística e publicitária, design digital e vídeo. De qualquer forma considero meus 20 anos dentro do mercado editorial a minha melhor escola, onde convivi e aprendi com grandes diretores de arte e alguns dos mais renomados profissionais do jornalismo. Não desconsidero a essencialidade da formação acadêmica, mas em comunicação nada será mais valioso do que a prática na minha opinião. 


Você pode descrever sua trajetória até chegar na revista Época?
Comecei estagiando em uma empresa de cursos por correspondência. Isso a muuuito tempo atrás. Quem lia revistas em quadrinhos nos anos 80 vai se lembrar. Eu era assistente de arte e criava peças de divulgação e o material didático. Tudo numa época em que a diagramação (design era uma palavra ainda um tanto distante do mundo editorial) era feita a mão, numa técnica chamada past-up. Após isso fui trabalhar na Editora Globo como colorista de quadrinhos da turma da Mônica. Também de forma artesanal, com pincel e um guache especial. Sério. E adorava. Como sempre fui apaixonado por quadrinhos foi um momento muito divertido. Cheguei até a acreditar que seguiria carreira nessa área. Mas logo chegaram os primeiros Macs e fui transferido para uma empresa que fazia a mesma pintura de forma digital, numa versão embrionária do Photoshop. Uma revolução para a época. Foi lá que voltei a ter contato com design, só que dessa vez no computador. Era o momento do QuarkXPress e PageMaker, na era paleolítica do design editorial. Lá trabalhei com peças publicitárias e revistas customizadas. Quando a Editora Globo implantou os Macs para suas revistas eu voltei, dessa vez como designer. Após ter trabalhado para inúmeras revistas da empresa, como Crescer, Globo Ciência (antiga Galileu), Marie Claire, Destino, entre outras, recebi o convite para fazer parte do projeto para uma nova publicação semanal de informação. Essa revista era a Época e lá se vão 15 anos.

Você sempre quis trabalhar com design editorial?
Minha paixão sempre foi a criação de maneira geral. Desde garoto eu fazia meus próprios quadrinhos (dobrando folhas sulfites montava minhas próprias revistinhas com personagens que eu mesmo criava). Outra coisa que adorava era ficar admirando e analisando todos os outdoors que via pela rua enquanto passeava de carro com a família (leis como a Cidade-Limpa de São Paulo não permitiriam isso hoje...rs).  Observava a ideia, as cores, a composição e até os tipos usados. Na adolescência registrava os eventos da minha turma de amigos numa espécie de fanzine bem artesanal. Eu fazia o design, ilustrações e ainda escrevia os textos, tudo na mão pois computador ainda era coisa de banco naquela época. Um outro amigo tirava cópias em xerox e distribuímos a todos. E aquilo me deixava entusiasmado. De alguma forma eu sabia que iria trabalhar com comunicação um dia. E o design editorial me parecia perfeito pois unia a forma e o conteúdo.

Como é seu processo de criação na direção de arte de uma revista semanal?
Gosto de discutir a pauta para perceber se existe algo que podemos extrair dela. Como o tempo é curto o ideal é manter o foco nas matérias que rendem mais possibilidades visuais. Quanto mais intimidade com ela melhor será o resultado. Costumo afirmar que estou ali para ajudar no processo de compreensão do tema e, de quebra, tentar deixar tudo mais atraente. Não que o resto seja menosprezado. Procuro zelar pela elegância de toda a edição e já ganhei fama de chato por isso... rs. Venho de um tempo onde o departamento de arte era considerado apenas uma área de apoio do jornalismo. Isso se devia ao fato desse aspecto ser estruturado como algo estritamente industrial naquele tempo. Era algo técnico, somente. Muitas vezes ali se ganhava o tempo perdido em outras etapas. Hoje isso mudou em muito aspectos. Os recursos tecnológicos à disposição nos permitiram manter a linha de montagem funcionando e ainda abrir espaço para a criatividade. Isso sem contar que os designers são mais especializados. Design é conteúdo e não dá para imaginar uma publicação de qualidade hoje em dia que não leve isso a sério.

Quais revistas pra você, possuem um bom projeto gráfico?
Sou um fã da Esquire americana. Sempre a considerei uma bíblia do design editorial com sua edição de arte meticulosa atenta aos mínimos detalhes, a chamada micro-edição visual. Outras que me impressionam são a New Yorker, Bloomberg Business, New Republic e a Wired. Trabalhar com revistas de hardnews também me fez apreciar outros tipos de projetos, aqueles mais cleans e funcionais, numa linha mais fine design como The New York Times Magazine e The Hollywood Reporter. Também adoro ver alguns experimentalismos e rupturas como a Metropoli. Porém atualmente projetos gráficos inovadores se tornaram corriqueiros. A cada dia descubro um novo. Principalmente lá fora. Não dá para imaginar uma revista que permaneça mais de 2 anos com o mesmo projeto hoje em dia. Podem até chamar isso de tática desesperada mas a verdade é que temos que disputar a atenção com coisas mais instigantes. As velhas fórmulas monolíticas de design editorial já deram o que tinham que dar.


Quais são os detalhes fundamentais na criação de uma boa página?
Sempre digo que entender do que se trata a matéria já abre um bom leque de possibilidades visuais, pois ajuda a decidir desde a linguagem fotográfica até os grafismos que vão estar nela. Uma boa conversa com quem vai escrevê-la pode ajudar a descobrir alternativas para sair da fórmula texto/foto (assim é possível descobrir a descrição de um esquema, de uma localização geográfica ou uma amostragem de dados que seriam melhores aproveitados na forma de um infográfico, por exemplo). Na parte técnica sempre considero os cuidados com a micro-edição indispensáveis. Saber onde aplicar cores e linhas, definir decorações e até onde o texto pode ser bold ou itálico fazem uma diferença brutal no conjunto da coisa. Evitar abusar das pequenas "mágicas" como recorte de foto, text wrap (aqueles recuos no texto) e o famigerado drop shadow também deixam a página mais elegante.



"Gosto de discutir a pauta para 
perceber se existe algo que podemos 
extrair dela. Quanto mais intimidade 
com ela melhor será o resultado."



E os piores erros de diagramação?
Acho que até já disse na resposta anterior mas a falta de micro-edição visual me incomoda muito. Faz um layout parecer ter sido feito em um processador de texto. Os textos ficam chapados e jogados sem nenhum tratamento, causando uma monotonia que deixa a revista com um ar amador. Sem contar que a perda não é só estética. Esse acabamento mais detalhado muitas vezes ajuda a hierarquização das informações, principalmente em quadros e infográficos. Outra coisa ruim é o desleixo com colunagens. Erro básico, mas ainda corriqueiro. Mas nada disso supera um recuo no texto (o tal text wrap) que o torna sua passagem tão estreita que ele fica quase ilegível ou um drop shadow cafona aplicado sem contexto algum. Dói de ver.


O que você busca de um profissional que quer trabalhar com design editorial?
Um bom designer editorial tem que entender que nosso trabalho é técnico e criativo ao mesmo tempo. Não dá para ser somente um. Além de zelar pela estética ele tem que estar atento aos nós da produção. Levando também em consideração o que disse sobre o design ser conteúdo acredito que um bom designer editorial deva ser alguém bem informado, não só sobre o que lhe interessa mas em relação a tudo. Entender melhor o big picture pode ser um diferencial na hora dar o certo peso as coisas e criar um bom projeto. Ainda mais em produtos jornalísticos onde a informação é o alicerce.


Um tema muito em pauta ultimamente é o futuro dos impressos, como você vê isso?
É tudo muito incerto e inóspito. É fato que as publicações impressas perderam - e continuam perdendo - a relevância que tinham, mas mesmo assim não acredito que desaparecerão tão cedo. Eu sei que a crise do mercado de revistas e jornais está se acentuando e negar isso é loucura, mas faço a seguinte analogia: imagine uma esponja encharcada dentro de um copo. Se você começar a comprimi-la vai jogar a água para fora e o seu tamanho vai ficar menor, só que se continuar comprimindo em determinado momento não vai mais conseguir empurrá-la pois chegará ao limite de sua massa original. Dali não passa. Então imagino que esse seja o fôlego de mercado que cada publicação terá. Sua estrutura e tiragem vão ter que ser adaptadas a ele. Não imagino um futuro próximo de grandes publicações, com milhões de leitores espalhados pelo país todo, e sim, de revistas segmentadas e regionais publicadas por estruturas menores, talvez pequenas editoras ou algo do tipo e não mais por grandes complexos editoriais. Talvez por algum tempo ainda existirão pessoas interessadas em produtos assim. O quanto isso duraria eu também não sei, mas me parece mais real. Só que isso é puro exercício de futurologia. Agora o que eu acredito de verdade é que essa crise não é da comunicação e, sim, do modelo e do formato. O que acontece com a informação hoje em dia não tem paralelo na história. Eu, por exemplo, nunca consumi tanto conteúdo na vida como agora. E olha que já fui um voraz comprador de revistas e jornais, e mesmo assim não tem comparação. Hoje leio veículos que não tinha o menor hábito em ler e alguns que nem conhecia, como publicações de outros estados e até de outros países. A internet possibilitou isso e acho que estamos apenas no começo. Por isso não quero ser aquele que fica parado olhando de longe e resmungando que todo mundo hoje em dia se acha designer, jornalista, fotógrafo, etc... quero estar no bololô e ver onde isso vai dar. Como ganhar dinheiro nisso? Esta aí outra coisa eu não sei, mas se tem um fundamento do marketing que dificilmente mudará tão cedo é aquele que diz que, se você tiver uma marca forte e de grande alcance, outras marcas vão querer suas estar associadas a ela. Só que para ser popular com tanta competição você tem que ser bom e inovar... de verdade. Fazendo mais do mesmo é que não vai rolar.



"É fato que as publicações impressas 
perderam - e continuam perdendo - a 
relevância que tinham, mas mesmo assim 
não acredito que desaparecerão tão cedo".



E pra finalizar, em quem você se inspira no universo do design gráfico?
No design editorial o grande mestre da atualidade, sem dúvida nenhuma, é Arem Duplessis, diretor de design da The New York Times Magazine. A elegância do fine design que confere às capas e projetos é sempre inspiradora. Gosto também da inquietação do Richard Turley, diretor de arte da Bloomberg Business, e do estilo meticuloso do italiano Francesco Franchi, que faz das micro-edições de seus projetos e infográficos algo admirável. No universo mais amplo do design gráfico as obras de Paul Rand, Saul Bass e Alfons Mucha sempre serão grandes influências.



E aí gostaram? Então, follow Alexandre Lucas!

Blog: http://alucasdesign.blogspot.com.br/
Twitter: https://twitter.com/alucasdesign
Instagram: http://instagram.com/ale_lucas 

 

Agora algumas de suas páginas e ilustrações:



  


 





  
















Um comentário:

  1. Muito boa a entrevista! Nossa ele é das antigas, legal ver gente assim... O cara trabalhava no Instituto Universal Brasileiro, é isso? rs

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